Quando falamos em saúde pública, é comum que o debate se concentre em hospitais, vacinas e políticas de assistência médica. No entanto, existe um componente essencial que, embora menos lembrado, exerce impacto direto sobre a saúde da população: a moradia.
Mais de 40 milhões de brasileiros vivem em residências inadequadas, segundo levantamento da PUCRS Online. Esse número revela um quadro que vai além da desigualdade social e representa um desafio de saúde pública de grandes proporções. A pergunta que se impõe é simples: quanto o sistema público de saúde poderia ser aliviado se conseguíssemos oferecer habitação digna em escala nacional?
O ponto de partida é básico. O acesso à água potável e ao saneamento não é um benefício, mas uma condição de sobrevivência. A Organização Mundial da Saúde associa diretamente a falta desses serviços ao aumento da mortalidade infantil. Uma casa com banheiro funcional e rede de esgoto adequada representa a primeira barreira contra infecções e doenças transmitidas pela água. É, em essência, política preventiva de saúde.
A pandemia de COVID-19 escancarou essa relação. A possibilidade de lavar as mãos com frequência e manter o ambiente limpo, algo trivial para alguns, tornou-se um luxo para milhões de brasileiros em moradias precárias.
O impacto da habitação vai muito além das doenças infecciosas. Ambientes insalubres, com umidade, mofo e ventilação insuficiente, favorecem o desenvolvimento de problemas respiratórios como asma e bronquite. De acordo com a Habitat Brasil, 89% das famílias que receberam melhorias em suas moradias relataram redução de sintomas respiratórios. Esse dado mostra que a reforma habitacional é também uma intervenção de saúde.
Os efeitos positivos se estendem à esfera emocional. Viver em um espaço seguro e adequado reduz o estresse, melhora o humor e restaura a sensação de dignidade. No mesmo estudo, 98% das famílias afirmaram ter percebido aumento na autoestima após as melhorias. É um resultado expressivo, sobretudo entre as famílias chefiadas por mulheres, maioria entre os lares de baixa renda, para quem a casa representa também um símbolo de proteção e estabilidade.
Esses dados reforçam que programas habitacionais como o Minha Casa, Minha Vida não devem ser vistos apenas como iniciativas de política social, mas como instrumentos de promoção de saúde pública. Estudos da FGV EPGE buscam justamente quantificar essas externalidades positivas, como a habitação adequada contribui para reduzir o absenteísmo no trabalho, o número de internações e os custos do sistema público de saúde.
Investir em moradia é investir em prevenção, produtividade e qualidade de vida. É olhar para a política habitacional não apenas sob o prisma da construção, mas da eficiência social.
Reconhecer a moradia como um determinante social da saúde é um passo fundamental para o desenvolvimento do país. Garantir que cada família tenha acesso a uma casa segura, com saneamento e conforto, é uma das formas mais eficazes e humanas de fortalecer o sistema público e construir uma sociedade mais equilibrada.
*Por Stael Xavier é Diretora executiva de Negócios da SteelCorp, ecossistema completo de empresas especializadas em construção industrializada
