Tributo municipal instituído quando há transação onerosa de um imóvel, o Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) deve ser pago ao município pelo comprador de um imóvel, sendo uma etapa necessária para oficializar a aquisição da propriedade. Contudo, como fica a cobrança do ITBI e quem deve pagar o tributo em casos de inadimplência da alienação fiduciária, ou seja, a suspensão de pagamento da dívida do financiamento adquirido para a compra do imóvel por parte do comprador/devedor?
Em casos de compra à vista, ou com financiamento próprio, o ITBI geralmente é incluído na transação realizada em um único movimento pelo comprador. No entanto, a maioria das aquisições de imóveis no País é realizada por meio de financiamentos obtidos em bancos ou nas incorporadoras, que se transformam em credores fiduciários do comprador/devedor e, legalmente, são os donos do imóvel até que o financiamento seja totalmente quitado.
Em 2020, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), por meio do Recurso Especial 1837704/DF, estabeleceu que, em casos de inadimplência de alienação fiduciária, o ITBI deve ser cobrado do banco ou incorporadora quando houver a retomada do imóvel, diante da comprovada inadimplência por parte do comprador/devedor. Essa decisão foi corroborada neste ano pelo acórdão do Recurso Especial 1937821/SP, também pelo STJ. Os municípios já cobravam o ITBI dos credores, nos casos de inadimplência, com base no artigo 26, parágrafo 7º da Lei nº 9.514, de 20 de novembro de 1997, que dispõe sobre o Sistema de Financiamento Imobiliário e institui a Alienação Fiduciária.
Os credores fiduciários, no entanto, entendiam ser essa cobrança indevida, sob o fundamento de que não há transferência de propriedade em casos de inadimplência, e que a cobrança do imposto, neste cenário, configura-se em bitributação. Os argumentos de defesa dos credores fiduciários eram no sentido de que a natureza jurídica da alienação fiduciária é de garantia, existindo previsão de não incidência do ITBI (art. 35, II do Código Tributário Nacional), e que na retomada do imóvel não há uma nova transação, pois não haveria transferência de propriedade, mas, sim, anulação contratual.
Contudo, o STJ, no Resp 1837704/DF, entendeu que “o credor fiduciário é mero detentor do citado direito de garantia, e não pleno proprietário, o que somente ocorre com a consolidação pela inadimplência da dívida pelo devedor”. Em outras palavras, a incidência de ITBI deve-se ao fato de que o imóvel deixa de ter natureza de garantia e, efetivamente, tem sua propriedade transmitida a outrem, no caso, o credor fiduciário, quando a inadimplência acontece.
Dessa forma, tendo a decisão sido mantida em desfavor dos credores fiduciários, o que se deve considerar é a base de cálculo que incidirá no ITBI. No Resp 1.937.821/SP deste ano, o STJ firmou três teses para a base de cálculo do ITBI em casos de inadimplência da alienação fiduciária:
- A base de cálculo do ITBI é o valor do imóvel transmitido em condições normais de mercado, não estando vinculada à base de cálculo do IPTU, que nem sequer pode ser utilizada como piso de tributação;
- O valor da transação declarado pelo contribuinte goza da presunção de que é condizente com o valor de mercado, que somente pode ser afastada pelo fisco mediante a instauração regular de processo administrativo próprio (art. 148 do CTN);
- O município não pode arbitrar previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em valor de referência por ele estabelecido unilateralmente.
Em síntese, a base de cálculo do ITBI é fundamentada na impossibilidade prática do lançamento de ofício, ainda que fosse autorizado pelo legislador, pois o agente municipal não tem como possuir o conhecimento de todas as variáveis determinantes para a composição do valor do imóvel transacionado. Por consequência, para fins de determinação da base de cálculo do ITBI, deve-se considerar o valor de mercado do imóvel negociado de forma particular a partir do estado de conservação, benfeitorias, bem como as condições entre vendedor e comprador, razão pela qual o lançamento ocorre por declaração do contribuinte, sendo ressalvado ao Fisco o direito à revisão mediante procedimento administrativo, sujeito à ampla defesa e contraditório ao contribuinte.
Portanto, podemos concluir que, nos casos de inadimplemento de alienação fiduciária, a base de cálculo do ITBI para fins de transferência do devedor ao credor fiduciário é o valor de mercado, corrigido monetariamente, pelo qual o imóvel foi negociado entre vendedor e comprador.