A função de síndico exige mais do que uma gestão administrativa eficiente: é preciso ter responsabilidade legal, técnica e uma postura preventiva, especialmente em situações que envolvem reformas nas áreas comuns do condomínio. Sem os devidos cuidados, essas obras podem gerar conflitos, prejuízos e, em casos mais graves, responsabilização pessoal do síndico.
O Código Civil, em seu artigo 1.348, atribui ao síndico a função de zelar pela conservação e guarda das partes comuns. Essa incumbência inclui a realização de reformas e melhorias no condomínio. Contudo, o descumprimento de deveres, a falta de diligência ou a má condução da obra podem acarretar responsabilidade civil e até criminal ao síndico, especialmente se houver prejuízo aos condôminos ou risco à estrutura do edifício.
A atuação diligente e transparente do síndico é seu principal mecanismo de proteção jurídica. Exemplo é o caso de uma jurisprudência catarinense: no julgamento da Apelação Cível n. 0000938-85.2012.8.24.0048, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina analisou caso em que o condomínio buscava responsabilizar o ex-síndico por supostas irregularidades em obras. A Corte entendeu que não restaram comprovadas má gestão ou falhas graves, destacando que a ausência de provas afasta a responsabilidade pessoal.
O primeiro passo para uma obra segura e juridicamente respaldada é a obtenção de pelo menos três orçamentos. A medida garante transparência, permite comparação de preços e condições, e evita a imputação de favorecimento indevido.
Os orçamentos devem ser detalhados, contemplando aspectos como descrição técnica dos serviços; valores discriminados; cronograma de execução; cláusulas de garantia; e indicação de responsável técnico.
A contratação, por sua vez, deve recair sobre empresas regularmente constituídas e registradas nos conselhos de classe (CREA ou CAU). Além disso, é indispensável exigir a emissão da ART (Anotação de Responsabilidade Técnica) ou RRT (Registro de Responsabilidade Técnica), documento que vincula o profissional técnico à obra.
Essa exigência não é apenas burocrática: ela confere segurança jurídica e técnica, e pode ser determinante em caso de responsabilização futura. A escolha de profissionais sem habilitação pode gerar nulidade de contratos e imputação de responsabilidade direta ao síndico.
Outra prática recomendável é a formação de uma comissão de acompanhamento, com até cinco condôminos. Essa comissão pode auxiliar o síndico na tomada de decisões, no acompanhamento do cronograma e na solução de eventuais impasses. Embora não afaste a responsabilidade do síndico, a atuação conjunta e documentada da comissão promove governança interna e maior legitimidade nas decisões, o que reduz a judicialização.
Para obras que impactam a estrutura do edifício, interfiram em sistemas hidráulicos, elétricos, de gás ou fachada, recomenda-se a realização de laudo técnico prévio. Essa perícia estrutural deve ser assinada por profissional habilitado e acompanhar o projeto da obra.
Além de reforçar a segurança, o laudo serve como documento de prova preventiva, protegendo o síndico de futuras alegações de negligência. É importante lembrar que obras dessa natureza também exigem aprovação em assembleia condominial, com quórum qualificado, conforme o artigo 1.341 do Código Civil.
O síndico não é apenas gestor: é o representante legal do condomínio e, como tal, deve agir com cautela, técnica e transparência. As boas práticas são mecanismos de prevenção que protegem o condomínio e blindam o síndico contra responsabilizações indevidas. Mais do que evitar problemas, essas condutas constroem um ambiente de confiança, eficiência e valorização do patrimônio coletivo.
*Por Ricardo Murilo da Silva, advogado, sócio e gerente do setor imobiliário e extrajudicial do escritório Flávio Pinheiro Neto Advogados