Salvador: uma smart city em progresso
A cidade de Salvador, tornou-se a primeira capital brasileira a contar com planejamento estruturado, promovido pela Prefeitura, para se transformar em uma smart city – cidade inteligente. Através de um plano elaborado para que a cidade tenha mais serviços conectados, são desenvolvidas ferramentas para facilitar a prestação de serviço público, permitindo mais transparência nas ações da gestão e contribuindo com o dia a dia dos cidadãos. A primeira fase, que é a elaboração do planejamento, contou com um investimento de R$ 4,5 milhões e terá mais R$ 60 milhões investidos para a fase de implantação.
Em conversa com Luis Gaban, Diretor de Inovação da Prefeitura de Salvador, a partir de 2017 a cidade entrou na rota das cidades inteligentes, captando recursos financeiros junto ao Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF) e, em janeiro de 2020, iniciou o desenvolvimento do Plano Diretor de Tecnologia da Cidade Inteligente – PDTCI de Salvador, capitaneado pelo Consórcio Salvador Smart City / SPIN Soluções Públicas Inteligentes, finalizado em dezembro do mesmo ano e com implementação prevista para 2022.
No PDTCI de Salvador está prevista a integração dos diferentes espaços urbanos com disponibilização de conectividade generalizada de alta velocidade e resiliência sem diferenciar bairro, classe social, gênero, raça ou idade, processamento de dados em tempo real, segurança cibernética e privacidade de dados, plataforma colaborativa de governança, dispositivos inteligentes móveis, sensores/atuadores e big data urbano para análises preditivas.
Além de instrumento de orientação e regulação, o PDTCI de Salvador ajuda a dissipar névoas sobre o uso de tecnologias digitais na gestão urbana inteligente – coloca a igualdade e a dignidade das pessoas no centro do planejamento da cidade -, sustentável – propicia qualidade de vida -, resiliente – cuida do dia-a-dia dos cidadãos -, humana – garantia da conectividade como direito dos cidadãos – e cognitiva – entende e responde aos impactos da revolução digital na vida dos cidadãos. Assim abrindo caminhos para o conhecimento e, portanto, iluminando as trilhas possíveis na neblina da sustentabilidade econômica.
Normas internacionais são referência e prioridade
A concepção do PDTCI foi ancorada em preceitos técnicos da International Organization for Standardization (ISO), da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), alinhados aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU) e materializados em metas de longo prazo por meio de programas, iniciativas, projetos e ações visando à inteligência, resiliência, sustentabilidade, inclusão digital produtiva e qualidade de vida urbana.
“Foram aferidos 276 indicadores ISO/ABNT que abrangem serviços urbanos e qualidade de vida (ISO 37120), inteligência (ISO 37122) e resiliência da comunidade (ISO 37123), levantamento de dados sobre ambiente tecnológico, recursos humanos alocados e dispêndios com tecnologia da informação e comunicação nos órgãos e entidades municipais, instituições atuantes, entre outros”, afirma o Diretor de Inovação Luiz Gaban.
Visando a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos, foram propostos 50 Objetivos da Cidade Inteligente (OCIs) com metas de longo prazo a serem alcançadas no horizonte de 30 anos, com soluções inteligentes integradas e, a cada novo mandato dos gestores, serão selecionados os projetos a serem realizados em curto e médio prazo, revendo soluções técnicas e incorporando novos dados e informações geradas pelos diversos organismos atuantes.
No contexto do PDTCI, a cidade inteligente está planejada como um fenômeno contemporâneo do urbanismo, um modo de viver caracterizado pela ampla inserção cidadã dos indivíduos no espaço urbano onde habita e realiza as suas atividades cotidianas, com o atendimento satisfatório das suas demandas de locomover, trabalhar, comunicar-se e se relacionar com o meio ambiente, com a maior eficiência e qualidade de vida possível.
Cidades inteligentes no Brasil e no mundo
As cidades têm a função de unir os seres humanos, com diferentes sociedades que possuem normas e comportamentos diversos. Cada uma é única, tem suas características assim como também terá uma determinada transição para se tornar uma cidade inteligente.
Segundo o Ranking da Connected Smart Cities de 2021, as primeiras cidades mais inteligentes do Brasil estão na seguinte ordem: São Paulo, Florianópolis, Curitiba, Brasília, Vitória, São Caetano do Sul, Rio de Janeiro, Campinas e Niterói. A cidade de Salvador está na décima posição. Com a implantação do PDTCI, Salvador vai subir rapidamente posições no ranking nos próximos anos.
Já no ranking internacional de cidades mais inteligentes, de acordo com o Centro de Globalização e Estratégia do IESE estão: Londres (Reino Unido); Nova York (Estados Unidos); Paris (França); Tóquio (Japão); Reiquiavique (Islândia); Copenhague (Dinamarca); Berlim (Alemanha); Amsterdam (Países Baixos); Singapura (Singapura) e Hong Kong (China).
A jornalista Carla Viveiros, mora na China há quatro anos, dois deles foram na cidade de Shenzhen e atualmente reside em Xi’an. A escolha de morar em outro país foi uma surpresa interessante da vida, onde reconhece que nesse processo as facilidades do dia a dia fazem muita diferença. Quando perguntada o quanto morar em uma smart city impacta na sua rotina, Carla logo respondeu: “Incrivelmente! Viver em uma cidade que pensa na sua qualidade de vida, trazendo facilidades tecnológicas impacta muito. Questões como segurança pública ficam mais simples, você se sente mais protegido. As facilidades de pagamentos desde compras até transporte público fica mais fácil. É tudo muito simples. Com a pandemia, viver em uma smart city foi fundamental para o controle e segurança”.
A jornalista admite que a digitalização da vida é a melhor parte. Na China, dificilmente se tem carteira. Tudo é pago com os apps, aluga desde bikes até carregador de celular. O controle de pandemia (vacina, testes, viagens) é todo pelo celular. Carla acredita que cidades altamente digitalizadas podem ser um bom parâmetro para cidades no Brasil.
Com vários modelos de cidades inteligentes pelo mundo, é preciso compreender que o processo em cada lugar acontece de maneira diferente. “Apesar de exemplos bem sucedidos, tornar-se cidade inteligente não significa a mesma coisa em Dubai, Valência, Barcelona, Coreia ou Singapura (cidade-nação). Tendo em vista que, cada cidade possui um DNA, onde as soluções para se tornarem inteligentes estão ancoradas em diferentes visões, modelos de negócio e prioridades para alcançar seus objetivos. Ficando explícita a necessidade de planejar holisticamente desde o início”, discursa Luiz Gaban.
Na cidade de Salvador, a principal preocupação foi que a partir do PDTCI, o conceito de inteligência surgisse como uma nova dimensão da gestão pública, para o enfrentamento dos desafios urbanos, visando a qualidade de vida de todos os cidadãos e cidadãs soteropolitanos.
Benefícios do projeto smart city em Salvador
O reflexo do plano de transformação de Salvador em uma cidade inteligente irá beneficiar em todos os sentidos a populacão. Como foi dito pelo Diretor de Inovação Luiz Gaban, entre os ganhos sociais vale destacar o ecossistema de cidadania digital e democratização do conhecimento concebido para a Cidade Inteligente de Salvador. Que visa abrir novos caminhos para o engajamento e o empoderamento dos cidadãos e cidadãs, com a participação do setor privado, academia e o surgimento de novos negócios – parceria público-privado-pessoas-, com a participação ampla e diversificada dos grupos vulneráveis em atividades econômicas, com estímulo a novas habilidades para o domínio de negócios digitais que possam contribuir na criação de riqueza, de forma a fortalecer a resiliência urbana, onde a tecnologia é aplicada para fomentar o crescimento econômico inclusivo.
Quanto aos benefícios econômicos, vale ressaltar o fortalecimento do ecossistema, com estímulo à cultura da inovação e do empreendedorismo tecnológico. Incentivando o desenvolvimento de startups visando transformar Salvador em um centro de referência de tecnologia e inovação, possibilitando aumentar a visibilidade, atratividade, geração de negócios e novos investimentos. O que certamente resultará em um maior desenvolvimento socioeconômico para a cidade, tendo em vista que, as startups e o ecossistema empreendedor constituem a alavanca da construção das cidades inteligentes e do desenvolvimento de soluções disruptivas.
A implementação dos projetos básicos e executivos concluídos em dezembro de 2020, está prevista para este ano, após a aprovação pela Câmara Municipal de Vereadores do Projeto de Lei que institui o Plano Diretor de Tecnologias da Cidade de Salvador.
Fala especialista
De acordo com Marcus Casaes, engenheiro e especialista de Internet das Coisas (IoT), o plano em Salvador contempla ações voltadas para áreas da educação, saúde, ordem pública, prevenção de desastres, iluminação pública e mobilidade. Todas elas sendo geridas por um sistema integrado, que no PDTCI é chamado de Centro de Controle do Município.
“Para a estruturação de uma cidade inteligente é necessária uma modernização da infraestrutura da malha de conectividade da cidade, integrando internamente os órgãos públicos através de uma robusta de fibra ótica, que é definida como Infovia no PDTCI. Tecnologias como a IoT, que distribui sensores de coleta de dados que darão base para tomadas de decisões da gestão da cidade, desde a detecção de possíveis enchentes ao controle do consumo de energia elétrica nos prédios públicos”, explica Marcus Casaes.
A elaboração dos planos está seguindo diretrizes da ISO 37122:2019 e 37123:2019, que são normas internacionais de padronização de ações para que o poder público oferte a cidade bem-estar, atratividade, coesão social, preservação do meio ambiente, uso responsável dos recursos e resiliência. Uma das ações que a cidade está com uma atenção muito especial é a resiliência a desastres, que já contanto com o Plano Salvador Resiliente e com um moderno centro de monitoramento da Defesa Civil de Salvador, sendo um dos mais modernos do país.
Projeto analisa startups para serem parceiras
Para a transformação da cidade, no âmbito do PDTCI, está prevista a criação Sandbox Salvador, projeto que explora novas maneiras de trabalhar e viver juntos, criando empregos para o futuro, com estreita colaboração entre startups, academia, indústria e cidadãos. Com estabelecimento de ambiente de regulação, a fim de permitir condições perfeitas para que as startups testem novas soluções para a cidade inteligente, em um pequeno nível primeiro, antes de implementá-las em escala urbana, com o intuito de evitar riscos sistêmicos para a economia da cidade e para a qualidade de vida dos cidadãos e cidadãs.
Todas essas ações abrem oportunidades para o trabalho das startups. Em 2019, foram dez startups selecionadas no Edital Cidade Inteligente da Prefeitura de Salvador e ficaram incubadas por um ano no SENAI CIMATEC desenvolvendo suas tecnologias. Com destaque o Mosquito Zero – Plataforma de detecção e prevenção de proliferação de mosquitos de causadores de arbovirores, como zika e chicungunha. Outra startup selecionada foi a Goon Guide Tourism – Plataforma de contratação de Guias de Turismo Oficiais da Cidade. Mais startups apresentaram trabalhos para monitoramento de comportamento de pedestres em sinaleiras para reduzir riscos de atropelamentos, gestão remota de consumo de energia em prédios públicos, plataforma de ensino de robótica para alunos do ensino fundamental, plataforma de marcação de consultas e monitoramento de filas em unidades de saúde.
Principais conceitos de uma smart city
Utilizar a tecnologia para gerir recursos e infraestrutura, com o objetivo de impulsionar o desenvolvimento econômico e melhorar a qualidade de vida dos habitantes de forma sustentável, é ser uma cidade inteligente. Além de usar estrategicamente seus serviços para atender às necessidades sociais e econômicas da população.
Essa definição se popularizou nos últimos anos e vem evoluindo, tornando-se projetos relevantes nos governos. Hoje, uma smart city tem o objetivo de conectar o poder público e sua população, ofertando interação e acesso digital com os serviços públicos da cidade. Para transformar uma área urbana em um conceito tecnologicamente moderno, é necessário cumprir diferentes metas e utilizar diversos métodos nesse desafio.
Inicialmente, para alcançar este objetivo, toda a estrutura e processos de governança passam por um processo de informatização da gestão, para que estes serviços possam ter base para serem acessados pela população por uma única plataforma/aplicativo.
Estudos indicam ao todo, que são 101 as variáveis que compõem o nível de inteligência de uma cidade, divididas em nove dimensões ou setores principais, sendo os principais setores que indicam o grau de inteligência de uma cidade: capital humano, coesão social, economia, governança, meio ambiente, mobilidade e transporte, planejamento urbano, projeção internacional e tecnologia. Entre as principais estão o nível de educação da população, o acesso a serviços de internet e saneamento básico, disponibilidade de serviços de mobilidade e de economia compartilhada.