Uma normativa promete ampliar o alcance da Lei de Incentivo à Reciclagem, publicada em 5 de agosto de 2022, pelo potencial de destravar um mercado promissor para a execução de iniciativas e projetos sociais no Brasil. A versão anterior da lei – que trazia vetos à modalidade de incentivo fiscal – ganhou normas que estabelecem incentivos à indústria de reciclagem e criou mecanismos de fomento a projetos e ações voltadas à temática. Essa é a análise setorial do time de inteligência de mercado da Simbi – antiga Simbiose Social, uma social tech especializada em gestão do investimento social das empresas.
A Lei de Incentivo à Reciclagem determina que projetos previamente aprovados pelo Departamento de Gestão de Resíduos (órgão específico singular do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima) possam receber recurso do Imposto de Renda de pessoas físicas e/ou jurídicas tributadas com base no lucro real. Os contribuintes que são pessoa física poderão deduzir até 6% do imposto devido. As pessoas jurídicas, por sua vez, ficam limitadas à dedução de até 1% do imposto de renda em cada período de apuração trimestral ou anual. Para que um projeto consiga captar recursos ele deve estar contemplado em alguma dessas atividades.
- Capacitação, formação e assessoria técnica, inclusive para a promoção de intercâmbios, nacionais e internacionais, para as áreas escolar/acadêmica, empresarial, associações comunitárias e organizações sociais que explicitem como seu objeto a promoção, o desenvolvimento, a execução ou o fomento de atividades de reciclagem ou de reúso de materiais.
- Incubação de microempresas, de pequenas empresas, de cooperativas e de empreendimentos sociais solidários que atuem em atividades de reciclagem.
- Pesquisas e estudos para subsidiar ações que envolvam a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos.
- Implantação e adaptação de infraestrutura física de microempresas, de pequenas empresas, de indústrias, de cooperativas e de associações de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis.
- Aquisição de equipamentos e de veículos para a coleta seletiva, a reutilização, o beneficiamento, o tratamento e a reciclagem de materiais pelas indústrias, microempresas, pequenas empresas, cooperativas e associações de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis.
- Organização de redes de comercialização e de cadeias produtivas, e apoio a essas redes, integradas por microempresas, pequenas empresas, cooperativas e associações de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis.
- Fortalecimento da participação dos catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis nas cadeias de reciclagem.
- Desenvolvimento de novas tecnologias para agregar valor ao trabalho de coleta de materiais reutilizáveis e recicláveis.
Segundo os especialistas em inteligência de mercado, Cleber Lopes e Eduardo Augusto, da Simbi, a publicação da Lei de Incentivo à Reciclagem ainda é recente e há muitas questões abertas ao debate. “De qualquer forma, foi mostrado que é preciso haver políticas públicas sólidas que melhorem a situação do descarte do lixo e da reciclagem no Brasil. Esperamos que essa Lei se consolide, porque o caminho para construir um país sustentável ainda é longo. Portanto, é preciso haver um envolvimento entre os diversos setores da sociedade em prol desse bem comum, gerando impacto ambiental positivo e inclusão produtiva, promovendo dignidade aos trabalhadores do setor” ,afirmam os especialistas.
Para o ano de 2023, o Ministério da Fazenda – por meio dos Demonstrativos de Gastos Tributários (isenções, anistias, presunções creditícias, reduções de alíquotas, deduções, abatimentos e diferimentos de obrigações de natureza tributária realizadas com o objetivo de promover o desenvolvimento econômico ou social, não realizadas no orçamento, mas, sim, por intermédio do sistema tributário) – prevê uma despesa tributária de aproximadamente R$ 299 milhões, ou seja, o órgão pretende deixar de arrecadar essa cifra para destiná-la aos projetos aprovados nesta Lei.
Cenário da reciclagem no Brasil
A reciclagem – processamento de materiais (que já esgotaram sua vida útil) por meio da transformação física ou química no intuito de gerar novos produtos e bens de consumo – tem sido instrumento de inclusão produtiva e geração de renda para muitos brasileiros. Um levantamento feito em 2021 pela Associação Nacional de Catadores e Catadoras de Materiais Recicláveis (ANCAT) aponta que 375 organizações de catadores obtiveram juntas o total de R$ 159 milhões de faturamento com a venda de materiais para reciclagem. Em média, cada organização faturou R$ 424 mil por ano. A renda média mensal por catador é de R$ 1.098,00 só com a venda desses materiais.
O Decreto 5.940/2006 institui a separação dos resíduos recicláveis pelos órgãos públicos, na fonte geradora, e a sua destinação às organizações de catadores de materiais recicláveis. Porém, ainda é baixa a incidência dos contratos ou termos de parcerias dos órgãos públicos com essas organizações. Das 452 organizações entrevistadas pela ANCAT, somente 178 alegaram ter algum vínculo contratual nos âmbitos Estadual e Federal. Por mais que existam diversas pessoas e organizações trabalhando na coleta e reciclagem de produtos descartados, somente 4% dos resíduos sólidos que poderiam ser reciclados são enviados para esse processo.
Mapeamento conduzido pela Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe) em 2019 mostrou que os bens recicláveis que vão para lixões acarretam uma perda de R$ 14 bilhões ao ano, que poderiam gerar receita e renda para as organizações e pessoas que trabalham com essa atividade.