Certa vez, após uma reunião com o síndico e o conselho fiscal de um condomínio, ouvi o cliente dizer “nós temos um espaço instagramável!”. Ao ouvir este termo, achei interessante e lembrei instantaneamente da importância da análise da convenção condominial ao adquiri um imóvel em condomínio edilício.
No mercado imobiliário há uma preocupação em atender às necessidades da sociedade, as quais mudam constantemente com o passar do tempo. A geração Z foi socializada na era da internet e possui um domínio de tecnologias maior que as gerações anteriores. Dentre essas transformações, não se pode olvidar que, a pandemia do covid 19 também contribuiu para tais mudanças nos condomínios.
Vale ressaltar algumas transformações e tendências nos condomínios, podendo destacar a necessidade da presença de pet places, business place, instalação de diversas tecnologias para integrar o mundo offline e online, dispositivos que utilizam de QR codes e sensores diversos, sistemas fotovoltaicos para a geração de energia solar, garagens com suporte para carros elétricos, tudo com o fim de suprir as demandas dos moradores.
Em que pese a existência de tantos itens da lista, a qual só cresce, não poderíamos deixar de mencionar o condomínio instagramável! Sobretudo, antes de qualquer comentário, precisamos entender o que significa esse termo.
Segundo o dicionário priberam.org, instagramável significa aquilo que se pode instagramar ou publicar na rede social Instagram e, ainda, prevê que é aquilo que tem características próprias ou ideais para publicação na rede social Instagram (ex.: o hotel tem um ambiente muito instagramável).
O significado do termo é bastante relativo, sem dúvidas, até porque o que é publicável para um, pode não ser publicável para o outro. Mas partiremos de um senso médio do que as pessoas “curtem”. Todavia, o mais importante talvez não sejam as características estéticas que um condomínio possa ter, mas sim as responsabilidades que esses ambientes instagramáveis possam trazer.
Pois além da preocupação de trazer uma boa aparência ao ambiente, a tendência dos novos condomínios é a de criar também novos ambientes instagramáveis com a finalidade de proporcionar aos blogglers e influenciadores digitais, locais para seus trabalhos de filmagem e edição.
Segundo Walter Moraes, ”toda expressão formal e sensível da personalidade de um homem é imagem para o Direito. (…) A cinematografia e a televisão são formas de representação integral da figura humana. De uma e de outra pode dizer-se, com De Cupis, que avizinham extraordinariamente o espectador da inteira realidade, constituindo os mais graves modos de representação no que tange à tutela do direito. (…) Por outro lado, imagem não é só o aspecto físico total do sujeito, nem particularmente o semblante, como o teriam sustentado Schneickert e Koeni. Também as partes destacadas do corpo, desde que por elas se possa reconhecer o indivíduo, são imagem na índole jurídica: certas pessoas ficam famosas por seus olhos, por seus gestos, mesmo pelos seus membros.”
Portanto, ao inserir nos condomínios ambientes instagramáveis, com suporte para gravações e até mesmo edições, podem gerar um aumento de pessoas captando imagens de terceiros, de suas residências, vizinhos com seus pets e crianças ao redor. O que significa envolver direitos tutelados pela Constituição da República como o direito de imagem, bem como direitos previstos no ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente como o art. 17 que prevê a preservação da imagem.
A ideia pode ser fantástica para alguns, mas nem tanto para outros. Sobretudo, é importante destacar que devem constar no ato de instituição do condomínio edilício a discriminação e individualização das unidades exclusivas e das partes comuns, além das demais previsões conforme o art. 1.332 do Código Civil. Ainda que os regramentos de uso desses espaços, ou unidades, possam ser mais detalhados posteriormente no regimento interno, é importante que ao adquirir uma unidade exclusiva, o comprador esteja ciente de que, além dos ambientes convencionais, comumente conhecidos pela maioria, possuirá também um espaço especial para essas atividades.
Concordar com a existência desses ambientes não significa que as unidades autônomas também poderão se transformar em verdadeiros estúdios. Devendo lembrar que o fim a que as unidades se destinam também devem constar na Convenção e devem ser respeitados (art. 1.332, III do CC). Por isso, mas uma vez, a importância da existência de uma Convenção condominial e um Regimento interno para regrar tais questões.
Um espaço que, pelo olhar jurídico, traz responsabilidades como destacado acima, o direito de imagem por exemplo. Levando em consideração que ao gravar um vídeo em área comum aberta, correm grandes riscos de captar imagens de outras pessoas que não estejam “instagramáveis” ou que, apenas não desejam aparecer e serem “publicadas”, podendo gerar sérios problemas de convivência e muitas dores de cabeça para o síndico.
Bibliografia
MORAES, Walter. Direito à própria imagem I. Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 61, n. 443, setembro de 1972, p. 64, et seq.
“Instagramável”, in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2021, https://dicionario.priberam.org/instagram%C3%A1vel [consultado em 08-11-2022].