Administrar um condomínio exige, além de conhecimento jurídico e organizacional, uma habilidade cada vez mais valorizada: saber se comunicar. Em tempos de grupos de WhatsApp e respostas imediatas, basta uma mensagem ríspida para que os ânimos se acalorem e um problema pequeno ganhe grandes proporções. A boa notícia é que síndicos podem recorrer à comunicação não-violenta (CNV) para desarmar conflitos e restabelecer o clima de cooperação entre moradores.
O que é comunicação não-violenta?
Criada pelo psicólogo Marshall Rosenberg, a CNV se baseia em quatro pilares simples, mas transformadores:
- Observar sem julgar: descrever o que acontece de forma objetiva, sem rótulos ou acusações;
- Expressar sentimentos: dizer como determinada situação gera impacto emocional, sem atacar o outro;
- Identificar necessidades: deixar claro qual demanda real está por trás da reclamação;
- Fazer pedidos claros: propor ações concretas em vez de ordens ou críticas vagas.
Aplicar esses passos ajuda o síndico a manter a imparcialidade, reduzir tensões e incentivar a colaboração.
Como aplicar a CNV nos grupos de condomínio
- Respire antes de responder: ao receber uma mensagem ríspida, evite reagir de imediato. Respire, releia e formule uma resposta equilibrada. A pressa costuma alimentar ainda mais os atritos;
- Transforme críticas em observações objetivas: em vez de rebater acusações, traduza a reclamação em termos neutros, como: “Entendi que há insatisfação com a limpeza da garagem” em vez de “Você está sempre reclamando disso”;
- Mostre empatia com os sentimentos envolvidos: reconhecer a emoção do outro já reduz resistências. Por exemplo, diga: “Percebo que essa situação está gerando frustração” é mais eficaz do que ignorar ou minimizar o descontentamento;
- Apresente a necessidade coletiva: reforce o objetivo comum usando frases como: “Nosso desafio é manter as áreas comuns organizadas para todos”. Isso tira o foco da disputa pessoal e devolve o problema à coletividade;
- Finalize com um pedido claro e viável: solicite algo prático e colaborativo, pontuando com falas como: “Podem me enviar fotos dos pontos que precisam de atenção para que a equipe de limpeza aja de forma direcionada?”
Exemplos práticos
Discussão sobre vagas de garagem
Resposta possível: “Notei que há conflitos sobre o uso das vagas. Entendo que isso gera desconforto. Precisamos garantir igualdade no uso do espaço. Sugiro que todos enviem suas sugestões até sexta-feira para avaliarmos juntos uma solução.”
Reclamação sobre barulho
Resposta possível: “Compreendo que o barulho após as 22h gera incômodo. Nossa necessidade é manter o descanso coletivo respeitado. A partir de agora, pedimos que todos observem o horário de silêncio previsto no regulamento.”
Mensagem agressiva contra a administração
Resposta possível: “Percebo que há insatisfação com a última assembleia. Nossa meta é que as decisões sejam mais claras e transparentes. Podemos organizar um resumo das deliberações e encaminhar ao grupo até o fim da semana.”
Por que funciona?
A CNV não elimina os conflitos, mas muda a forma como eles são conduzidos. Em vez de escalada de hostilidade, o síndico cria espaço para diálogo e soluções conjuntas. Isso fortalece a confiança dos moradores, reduz mal-entendidos e melhora a convivência dentro e fora do grupo.
Síndicos que adotam a comunicação não-violenta transformam os grupos de WhatsApp de arenas de briga em canais de cooperação. Um pequeno ajuste nas palavras pode ser o grande diferencial para manter a harmonia condominial.
*Por Vanessa Gantmanis Munis Paione, advogada há mais de 20 anos, pós-graduada em Direito Tributário e especialista em Direito Condominial, Civil e Família e Sucessões. Síndica certificada pela Fundação Vanzolini/USP desde 2012, acumula vasta experiência em condomínios residenciais, horizontais, clubes e short stay. Atualmente é membro da Comissão da Advocacia Condominial da OAB/SP (2025), onde também atua na Coordenadoria de Compliance e Pets.