Nos últimos anos, tenho observado de perto a chegada da mobilidade elétrica ao Brasil. De acordo com a Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE), apenas em 2024 foram emplacados mais de 177 mil veículos eletrificados, um crescimento de 89% em relação ao ano anterior. Esse avanço já é visível nas garagens de condomínios, e com ele surge a necessidade de adequar a infraestrutura para oferecer pontos de recarga seguros e em conformidade com as novas normas.
O primeiro passo: avaliação técnica da infraestrutura
Instalar um ponto de recarga não é simplesmente puxar um cabo e ligar na rede. É essencial realizar uma avaliação completa da capacidade elétrica do prédio. Recomendo contratar um engenheiro eletricista para analisar o quadro geral de energia, a bitola dos cabos, os disjuntores e o sistema de aterramento. Esse diagnóstico vai indicar se será preciso reforçar a rede ou até solicitar aumento de carga à concessionária.
Outro ponto fundamental é definir o modelo de cobrança: cada vaga com medidor individual, para que o morador pague exatamente o que consome, ou um sistema compartilhado, com rateio entre os usuários. A individualização costuma ser mais justa, mas exige investimento maior na instalação.
Cuidados redobrados em prédios antigos
Nos edifícios mais antigos, a rede elétrica geralmente não foi projetada para demandas tão altas. Nesses casos, pode ser necessário trocar cabos, modernizar disjuntores e redesenhar rotas de passagem para cabos, sempre respeitando normas de segurança e acessibilidade. O objetivo é garantir que a adaptação não comprometa nem a estrutura nem as áreas comuns.
As novas normas de segurança contra incêndio
Em julho de 2025, após um ano e três meses de estudos, o Corpo de Bombeiros de São Paulo e a ABVE definiram novas exigências para garagens com pontos de recarga: chuveiros automáticos (sprinklers), sistemas de detecção de fumaça e de exaustão. Essas medidas respondem à complexidade dos incêndios em baterias de lítio, que podem atingir temperaturas acima de 500 °C e exigem métodos específicos de combate.
Algumas concessionárias já adotam soluções extremas, como tanques de dois metros de profundidade para imersão de veículos em chamas — inviáveis para condomínios, mas que ilustram a gravidade do risco.
O que o mundo está fazendo
No exterior, as regras são igualmente rigorosas: nos Estados Unidos, há exigência de barreiras corta-fogo e sistemas automáticos de supressão; na China, é obrigatória a inspeção periódica de carregadores e cabos; e na Alemanha, são previstas distâncias mínimas entre vagas e separação física das áreas de recarga. Essas referências ajudam a balizar a adaptação das normas brasileiras.
Como síndicos e administradoras podem se preparar
- Planejar com antecedência: mesmo que haja poucos usuários de veículos elétricos hoje, é mais seguro e econômico se antecipar.
- Contratar especialistas: apenas profissionais habilitados garantem um projeto dentro das exigências técnicas e legais.
- Registrar em assembleia: qualquer alteração deve estar prevista na convenção ou no regimento interno, evitando questionamentos jurídicos.
- Fazer manutenção preventiva: inspeções periódicas previnem falhas e aumentam a vida útil do sistema.
Impacto financeiro e formas de viabilizar
A instalação de pontos de recarga com todos os sistemas de segurança requer investimento. Algumas fabricantes oferecem programas de parceria, e linhas de crédito voltadas à eficiência energética podem ser acessadas por condomínios. O retorno vem na valorização do imóvel e na atratividade para novos moradores.
Erros que precisam ser evitados
Entre os erros mais comuns estão: instalar sem projeto aprovado, usar extensões ou adaptadores improvisados, não prever proteção contra sobrecorrente e curto-circuito e ignorar a necessidade de adequar o regimento interno. Essas falhas podem gerar riscos sérios e responsabilização civil e criminal.
Instalar pontos de recarga em condomínios é um passo inevitável para acompanhar o futuro da mobilidade. Mas é preciso fazer isso com segurança, responsabilidade e alinhamento às normas. A tecnologia é uma aliada poderosa, desde que venha acompanhada de planejamento e prudência.
Por Celso Zaffarani, proprietário da Zaffarani Design Building, empresa especializada em soluções de engenharia e design para edificações, com foco em sustentabilidade e inovação