A interpretação sobre os direitos que envolvem os animais de estimação está evoluindo rapidamente em nossa sociedade, e talvez tenha se acelerado ainda mais após o período de pandemia, em que muitas pessoas estiveram obrigatoriamente reclusas em seus lares. Neste sentido, os animais considerados seres inominados, hoje, já ganham nova interpretação com a chamada família multiespécie, considerando que os animais são seres sencientes, reconhecendo que são seres capazes de sentirem dor, angustia, solidão, amor.
O entendimento sobre o conceito de família multiespécie se baseia na caracterização do convívio familiar entre humanos e animais, e supomos que seu crescimento seja exponencial e irreversível, sendo levado ao debate cada vez mais para o abrigo da legislação brasileira, que ainda tem muitas lacunas.
Podemos perceber que as avaliações e interpretações de tudo que envolve o conceito de animal doméstico no convívio diário já impacta no nosso dia a dia. Ao frequentarmos shoppings, restaurantes e lojas de departamento já verificamos que esses locais não só permitem a entrada de animais de estimação, como também disponibilizam espaços destinados a eles com água, plástico para recolhimento de fezes e um cantinho de descanso, sendo assim conhecidos como estabelecimentos Pet Friendly, ou seja, locais onde eles são bem-vindos e, portanto, além de não oferecerem resistência quanto a presença, oferecem comodidades para que ali estejam com seus tutores.
É bom ressaltar que, nessa evolução da ampliação dos direitos dos animais, já existia o reconhecimento generalizado quanto a importância do animal de estimação até mesmo em locais de tratamento de saúde humana, como por exemplo em hospitais para visitação, pois a ciência reconhece que eles podem auxiliar na recuperação de pacientes, especialmente por despertarem sensações de bem-estar que aceleram os efeitos positivos desejáveis do tratamento.
Quanto às movimentações na parte legislativa, podemos citar, por exemplo, que tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 179/23, que trata da ampliação de vários direitos dos animais, concedendo o direito de acesso à justiça, de proteção em caso de separação de seus tutores, entre várias outras questões que resguardam o bem-estar dos animais, inclusive prevendo o direito à herança. Supomos que, caso este projeto seja aprovado, serão ainda maiores os direitos dos pets e, consequentemente, novas adaptações na vida dos condomínios serão necessárias, motivo pelo qual os síndicos precisam estar antenados com essa tendência, de modo que seus ambientes estejam cada vez mais capacitados para lidar com esta realidade.
Essa evolução de convivência entre humanos e animais afeta significativamente a vida em condomínios e, neste sentido, muitos novos empreendimentos imobiliários são construídos com espaços pet e já não é mais possível proibir animais nas residências, mesmo que as convenções de condomínios tenham explicitamente tal regra.
Portanto, está claro que cada vez mais os animais domésticos estão inseridos na vida familiar das pessoas e com mais direitos dentro dos condomínios, inclusive sob maior proteção do judiciário. Entretanto, não podemos esquecer que os animais precisam de regras para o convívio coletivo e é obrigação do condomínio zelar pela saúde e bem-estar de todos.
Dentro dessa lógica, o condomínio precisa criar regras para que essa convivência seja pacífica e respeitosa. E entre várias dúvidas existentes que se referem aos animais de estimação, há o questionamento da obrigatoriedade ou não de se apresentar a carteira de vacinação aos administradores dos condomínios.
Entendemos que este assunto ainda é polêmico, pois não existe uma lei clara que defina que o condomínio é obrigado a exigir a carteira de vacinação do animal, mas em se tratando da vida em condomínio e do bom senso para a vida em comunidade, tendo em vista que o animal pode transmitir doenças aos outros animais, bem como a humanos, é justa e recomendável a apresentação do documento.
Além disso, a vacinação é de suma importância para a saúde e bem-estar dos animais. Entre várias doenças possíveis, a raiva, principal delas, pode ser facilmente controlada com a vacina antirrábica. As campanhas de vacinação acontecem periodicamente e são gratuitas. Os animais que contraem a doença morrem em 100% dos casos, além de ser uma doença que pode ser transmitida aos humanos, cujos sintomas podem levar até a paralisia.
Portanto, independentemente da existência de leis que definam ou não a obrigatoriedade da apresentação da carteira de vacinação, entendemos que é razoável a solicitação por parte dos condomínios, a fim de garantir que todos estejam devidamente protegidos e saudáveis.
Importante também destacar que a vacinação dos animais é obrigatória, além de ser um ato de proteção e zelo com o seu bichinho de estimação. Independente da apresentação ou não da carteira de vacinação dentro dos condomínios, todos os donos de animais devem procurar auxílio veterinário para o devido acompanhamento das vacinas.
Assim, para que o condomínio possa atuar de forma segura, é importante que criem suas regras de forma clara através de assembleias, e do regimento interno, a fim de dar o devido respaldo ao síndico e administradores, além de garantir um bom convívio coletivo.
Citamos algumas regras importantes que podem ser previstas nas normas do condomínio, a saber: 1) cadastro obrigatório dos animais; 2) apresentação da carteira de vacinação; 3) utilização de coleira; 4) crianças não devem conduzir animais sozinhas.
A criação de regras e normas que visam a boa relação entre os moradores é de suma importância, pois, além de não ser possível a proibição dos animais em condomínios, também é direito do morador receber visitas pets em sua residência, o que pode gerar mais conflitos com a ausência de normas.
Creio que seja um tanto óbvia a constatação de que a existência de regras pré-estabelecidas tende a garantir uma harmonia entre a diversidade de opiniões existentes na nossa sociedade.
Aos moradores donos de pets, sugerimos 5 dicas para uma boa convivência dos bichinhos em condomínios:
- Ao entrar e sair com seu animal, tome cuidado com o local em que os animais farão suas necessidades fisiológicas e garanta que o espaço fique limpo, sempre recolhendo as fezes;
- Mantenha o animal sempre na coleira (guia) e, preferencialmente, com identificação com o nome do animal e telefone do seu tutor para contato;
- Animais de grande porte e de algumas raças devem usar focinheira de forma obrigatória, conforme determina a Lei Federal no. 2.140, de 2011. Além disso, alguns animais não estão acostumados com crianças ou até mesmo com outros animais e podem estranhar, nesses casos, é aconselhável o uso de focinheira evitando acidentes.
- Mantenha os animais vacinados, pois, além de prevenir doenças, é fundamental para saúde e bem-estar do seu pet;
- Controle os latidos e barulhos provocados pelos seus animais de estimação, evitando desgastes entre vizinhos. Se necessário, contrate um adestrador, evite deixar o animal muito tempo sozinho ou preso. Dependendo de cada situação, é possível que isso seja considerado maus tratos e o condomínio fica obrigado a fazer a denúncia aos órgãos públicos.
- Não deixe de fazer a limpeza do ambiente da sua casa destinado ao uso de seus pets. Sabemos que é comum que alguns moradores utilizem as varandas como banheiro dos animais e a falta de cuidados com o espaço pode gerar muitos incômodos com mau cheiro e o local pode se tornar até insalubre.
Portanto, é fundamental a consciência de que é obrigação dos tutores de pets zelar pela vida, saúde e bem-estar dos animais e, portanto, deixar animais presos, em ambientes com temperatura inapropriada, sem água ou alimentação, pode caracterizar a prática de crimes previstos em lei.
*Por Anna Carolina Chazan e Marllon Furtado, gerentes gerais de condomínios da Estasa Administradora