O aluguel de propriedades privadas para fins turísticos se tornou prática muito comum, em especial com a expansão de sites como o Airbnb, líder do setor. É através desse tipo de site que turistas que pretendem fugir dos hotéis tradicionais encontram apartamentos, casas e outros formatos de hospedagem. De forma geral, essa modalidade oferece mais liberdade, melhor custo-benefício e uma sensação mais familiar, já que hotéis, muitas vezes, transmitem aspecto mais impessoal.
O debate jurídico surge quando esses espaços a serem alugados fazem parte de um condomínio residencial, já que tal utilização da propriedade particular ultrapassa as fronteiras bem definidas em lei para esse tipo de condomínio. Os condomínios edilícios são constituídos através de convenção, documento onde deve constar a finalidade do condomínio, que pode ser residencial, comercial, mista ou, ainda industrial, conforme o art. 1332 do Código Civil. A finalidade do condomínio só pode ser alterada por 2/3 (dois terços) dos votos dos condôminos.
Entretanto, a noção a respeito das diversas finalidades possíveis para um condomínio nem sempre ajuda a dirimir tal questão. Se de um lado não se pode afirmar que o uso do imóvel, nesse tipo de contrato, seria residencial, tampouco se pode enquadrá-lo como serviço de hospedagem.
Uma vez que o Airbnb pratica atividade que não está configurada como atividade de hotelaria e nem como atividade de locação, diz-se que se trata de um contrato atípico, como chamados aqueles contratos que não têm, ainda, uma previsão legal que os regulem.
Enquanto as empresas batem no clássico argumento do direito constitucional à propriedade, os condomínios tendem a proteger os interesses dos condôminos residentes, em especial quanto à segurança e outros tipos de distúrbios que podem envolver questões bastante desagradáveis para quem tem, naquele espaço, uma ligação familiar.
Em 2021, o STJ decidiu, no Recurso Especial 1.819.075, que os condomínios podem, sim, proibir o aluguel de imóveis por temporada. Para os ministros, não existe ilegalidade na proibição, uma vez que as locações por temporada podem oferecer risco ao sossego e segurança dos moradores, face à rotatividade de pessoas com pouco controle.
A defesa do Airbnb afirmou que tal tipo de locação é prevista na lei do inquilinato, e não configura atividade hoteleira, e tal proibição violaria o direito constitucional à propriedade.
Em que pese o argumento da empresa ser legítimo, está longe de ser suficiente para por fim a tal discussão. As lacunas na legislação não se suprem com superficialismos. Inclusive porque o direito constitucional à propriedade possui limitações. Na contramão de uma defesa falha, os condôminos e condomínios que pretendem vedar tal prática se valem da alegação de risco à segurança, em função da chegada e saída de locadores temporários. Além disso, alegam justamente que a locação por temporada desvirtua a finalidade residencial do condomínio.
E, por hora, justamente pela ausência de previsão legal ou entendimento fixo pelos tribunais, cabe tão somente a análise individual dos casos que buscarem solução na justiça. Aos condomínios que esbarrarem em questões do tipo e entenderem que existe um risco ou desconforto de qualquer tipo para os demais condôminos, o primeiro passo é deliberar em assembleia sobre o assunto, votando sobre o tema. Judicialmente falando, o caminho seria ingressar com a ação de obrigação de não fazer contra os proprietários do imóvel, alegando os diversos tipos de riscos e infortúnios aos quais estão expostos os demais condôminos.