A Lei nº 14.405, de 2022, publicada no Diário Oficial da União em 13 de julho de 2022, alterou o artigo 1.351 do Código Civil, para reduzir o quórum para a aprovação da alteração de uso de unidades em condomínios edilícios. A unanimidade antes exigida foi reduzida para o quórum de 2/3 (dois terços) dos condôminos.
Com isso, os condomínios que hoje são exclusivamente residenciais poderão ter parte ou totalidade das unidades autônomas convertidas para uso comercial, por exemplo.
A iniciativa mira facilitar tais alterações para um melhor aproveitamento com a atualização da condomínios concebidos sob uma vocação de uso que hoje se modificou. Prédio de lajes comerciais que ficaram subutilizadas podem ser convertidas em unidades residenciais, conferindo maior flexibilidade ao uso do imóvel e otimizando seu aproveitamento. Importante destacar, no entanto, que essa regra diz respeito apenas ao aspecto de governança do condomínio e não supera a necessidade de verificar as demais posturas para tal mudança, como a lei de zoneamento e o código de obras, que pode impor alterações nas características das edificações para as modificações pretendidas.
Embora a medida possa, de fato, abrir caminho para um novo uso de antigos espaços de escritórios, a Lei nº 14.405 é apenas um pequeno passo à frente no caminho de um enorme desafio de reurbanização de áreas e ressignificação de espaços urbanos.
Embora capitais como Belo Horizonte mesclem bastante espaços comerciais e residenciais dentro de um mesmo bairro, o Rio de Janeiro quase não conta com unidades residenciais no chamado centro da cidade. Com isso, também não conta com equipamentos e serviços urbanos que possam atrair interessados em morar na região.
Não à toa, inúmeras cidades têm dedicado esforços substanciais no sentido de rever os planos diretores das cidades. Entre setembro e outubro deste ano, o Rio de Janeiro terá uma intensa agenda de discussões. Já São Paulo também está prestes a concluir os trabalhos de revisão que teriam se encerrado em 2021, não fosse a pandemia de Covid-19.
A empreitada, que parece monumental, é absolutamente necessária à adequação das cidades às novas realidades, não só trazidas pela pandemia, mas também por outros fatores, como a introdução de novos serviços no cenário urbano, a exemplo da mudança que as dark kitchens trouxeram, ou mesmo a utilização de espaços de coworking e coliving.
Dentro do condomínio, essa nova regra deve ser interpretada com muito cuidado e atenção para evitar distorções e conflitos. Vejam dois aspectos que precisam ser considerados.
O primeiro aspecto se refere à necessária conciliação com as regras existentes da convenção do condomínio. Se é possível que a convenção estabeleça quórum mais restritivo do que o legal, o fato de o acordo prever outro quórum mais alto pode gerar discussões superáveis com a alteração da convenção.
O segundo aspecto se revela na possível confusão de mudança de uso com alteração da natureza de alguma parte do condomínio, que pode levar ao equívoco de que uma área comum poderia ter a sua natureza alterada com esse quórum.
Uma alteração de uso pode ser exemplificada de forma simples: a mudança de uma brinquedoteca para um novo salão de festas. Essa área não deixou de ser comum. No entanto, a alteração de um apartamento de zelador (área comum) para um apartamento a ser vendido (área privativa) não parece que pode ser interpretada como mera modificação da convenção.
Áreas comuns são inalienáveis por natureza e foram apropriadas como partes de das unidades autônomas do condomínio. Isso quer dizer que todos os condôminos possuem uma participação em tais áreas e, assim, tal alteração deve contar com a participação de todos.